quinta-feira, 31 de março de 2016

Luanda e os seus contrastes

Ontem estava num concerto de Piano e Canto, a delirar com aquela beleza, beleza da arte de bem cantar e bem tocar, quando a minha mente começou a divagar, o que é normal enquanto oiço música clássica.

Divaguei não para muito longe, na realidade continuei por Luanda. Lembrei-me que a algumas semanas tinha ido jantar a um restaurante francês e neste dia o chef tinha vindo de França e brindou-nos com belos pratos em que aliou a culinária francesa aos sabores tão típicos de Angola. Uma fusão que resultou em algo magnifique.

Mas ao lembrar-me desta noite em que a comida sabia a França e embalada pelo som do piano e da voz maravilhosa da Mezzo Soprano, lembrei-me também da carência do meu povo, lembrei-me das crianças que morrem nos hospitais porque faltam os medicamentos, os materiais hospitalares e até falta enfermeiros e médicos.

Lembrei-me, e não podia não deixar de me lembrar, do lixo que se acumula em todas as esquinas e todos os cantos, das águas paradas, mesmo não estando a chover, lembrei-me que o glamour que estava a viver nesta noite me distanciava dos milhões de angolanos que viviam em condições precárias.

E com este pensamento cheguei-me a sentir culpada. Será que faço o suficiente para ajudar o meu povo? Será que o dinheiro que paguei pelo jantar e pelo conserto não poderia ter usado para ajudar alguém? Será que me estava a tornar insensível a realidade do meu país? Será? Será? E os serás foram se acumulando na minha mente, preenchendo a minha alma.

Mas nos serás também surgiam respostas incompletas que tentavam acalmar a minha alma, que tentavam me fazer acreditar que fazia a minha parte, que não me deveria sentir culpada por ter a oportunidade de usufruir daquele momento.

Sei que poderia/posso fazer mais do que faço para ajudar o meu povo,  sei que poderia/posso ser mais participativa e não vou andar por aqui a inventar desculpas para justificar o porquê de não o fazer. A mudança começa em nós e todos nós temos a possibilidade de ajudar na mudança, basta querer.

Como tive a oportunidade de escrever para um grupo de amigos, somos uma pequena gota de água, mas se todas estas gotas se unirem, poderemos não criar um oceano de solidariedade mas de certeza que conseguiremos criar uma lagoa. 

Luanda e os seus contrastes, como a beleza de uma noite nos atinge perante a fealdade do que vai acontecendo não só as noites, mas também durante o dia, em todos os bairros em todas as esquinas...

Nos bairros não se ouve o canto de uma mezzo soprana nem o som do piano, ouve-se o choro de uma mãe, de um pai impotentes perante a situação, desesperados perante o vazio da perda... privilegiados somos nós que ouvimos um canto diferente, mas o facto de sermos privilegiados não nos deve tornar surdos para a dor. Privilegiados somos nós que degustamos sabores viajados, mas não nos podemos tornar cegos perante a carência que se tornou inquilina destas casas. 

Luanda e os seus contrastes... é assim a cidade onde vivo. Se tenho orgulho? Não, não tenho. Tenho orgulho do país que Deus criou para nós, lindo. Mas não tenho orgulho de saber que 99% dos meus irmãos sofrem...Vou continuar a ser uma gota, isto recuso-me a deixar de ser... um dia posso vir a ser uma lagoa.


domingo, 20 de março de 2016

Dia do Pai

Nunca tive das melhores relações com o  meu pai. Na realidade ele foi um pai ausente. Tive é uma mãe que foi as duas coisas...

Mas apesar de o meu pai ter sido ausente recordo-me que sempre morri de amores por ele. Sempre senti uma admiração, um pouco doentia, sem explicação por ele ... lembro-me de ser criança e de olhar para ele como se olhasse para o paraíso.

No conturbado da nossa relação sempre pensei que ele não me amava, que era aquela filha que ele teve e que foi mais uma ... Nunca o entendi e confesso que só no dia 07.12.2013 entendi quem era o meu pai e porquê da sua personalidade. ...perdi-o no dia 08.12.2013.

Sim, compreendi melhor o meu pai um dia antes de o perder. E o amor e admiração que sempre senti por ele, mas que sempre combati, veio ao de cima neste dia, por isso na última vez que tive com ele, no dia que o perdi, dei-lhe amor, o amor que sempre senti por ele.

Hoje sei que o meu pai me amou ... afinal fui a sua Nucha e só depois de muitos anos é que dei-me conta que sempre tive um nome de mimo para ele. Só depois de muitos anos é que percebi que quando o meu pai me ligava para falar de seguros ou da qualidade do sinal do telemóvel era a maneira dele dizer-me que estava com saudades.

Se cá estivesses provavelmente não ligaria para ti.... mandaria uma sms porque estaria zangada contigo.... mas hoje daria tudo para poder ter-te aqui comigo.

Não tínhamos uma boa relação mas eu sabia que estavas por cá. ..a distância de um telefonema  ou mesmo de 30 minutos de carro. Hoje já cá não estás. ...continuo a amar-te, a admirar-te, como sempre o fiz em segredo, mas hoje a desejar que não tivesses partido, que continuasses aqui.

Sinto saudades do que não vivemos, sinto saudades de ser a filha que desejei ser depois de te conpreender.

Um dia te amei, hoje te amo e te amarei para sempre meu pai e hoje como todos os dias sinto a tua falta.

Feliz dia do pai Luidgi, meu Luidgi. ..amo-te muito meu, muito meu Pai.