sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Lugares Especiais



Há lugares que quando os visitamos parece que roubam um pedaço de nós... mudando o que somos para sempre. 

Apesar de nos tirar um pedaço eles também acrescentam e com certeza que deixam uma saudade única, uma vontade indescritível de lá voltar.

Tenho alguns lugares assim na minha vida. Lugares em que quando lá cheguei não me senti como intrusa, mas sim como se fizesse parte e acima de tudo como se eles fizessem parte de mim...

A última vez que assim me senti foi em Cape Town, uma cidade que já visitei por algumas vezes, mas quanto mais a visito mais apaixonada fico por ela, e sinto-me roubada por ela... pois não só o meu coração lá fica de todas ás vezes, como desta vez ficou também a minha alma... e não mais serei a mesma.

A alguns dias alguém me disse que quando conhecemos alguém - conhecer no sentido de privar com a pessoa - que esta pessoa irá acabar por acrescentar sempre algo a nossa vida, eternizando a sua presença em nós, mesmo que a vida acabe por separar estes dois seres fisicamente. 

Acredito que o mesmo acontece com alguns lugares, não necessariamente cidades, como uso no meu exemplo, mas lugares, como por exemplo aquela praia em que ficaste horas a ler um livro, esquecendo que o tempo estava a correr e que havia vida a volta, aquela montanha que sentas para ver o pôr-do-sol num dia em que o que mais precisavas era esta visão, ou mesmo aquela praça numa velha cidade em que sentas no chão a comer uma comida típica numa tarde de verão e que te contagias pelo pulsar das pessoas...

Há lugares únicos que nos marcam, não pelo luxo, não por ser a cidade da moda, mas sim porque de algum modo nos acalentam a alma, nos fazem sentir amados, acolhidos e acima de tudo como se fizéssemos parte deles...

Sim tenho alguns lugares especiais, uns senti-os sozinha outros com outros seres especiais ... uns até hoje me inquietam a alma, tamanho é o roubo que fizeram em mim...tornando-se pertença de mim eternamente... esta foto foi tirada num destes lugares...





sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Feminismo sim, mas q.b.!

Sou mulher e assumo-me como feminista, não que ser mulher seja uma condição intrínseca para o feminismo. Até porque faço parte de uma sociedade que o comum é as mulheres criticarem as mulheres, como eu, que assumem-se como feministas.

Na sociedade em que vivo é esperado que as mulheres sejam submissas e se subjuguem aos homens desde aos pais aos maridos. É esperado que a mulher não responda, não pense e faça tal e qual o homem que a "comanda" decida o que é melhor para si. São desde muito novas ensinadas que ser independente e ambiciosas vai leva-las para um caminho de perdição e que provavelmente vão acabar sozinhas e desgraçadas.

Sou feminista, porque a minha mãe ensinou-me a ser. Porque, um dia ela foi uma mulher "machista" mas que queria voar, que queria ser feliz. Se hoje a minha mãe é uma feminista? Não diria tanto, mas pelo menos foi capaz de me ensinar a ser. Desde muito nova ensinou-me a ser independente, ambiciosa, a querer conquistar o mundo e a não aceitar a célebre frase "não podes fazer isso porque não é coisa de menina". E por isso hoje digo, obrigada mãe, pois graças a ti, posso dizer que sou uma feminista e sou feliz.

Mas vamos lá recuar um pouco ... o que é o feminismo? O que é ser feminista? Antes de dizer o que penso sobre isso, fui consultar o dicionário para ver o que dizia e a definição que encontrei foram estas:

Feminismo: movimento ideológico que preconiza a ampliação legal dos direitos civis e políticos da mulher ou a igualdade dos direitos dela aos do homem. (Poderá consultar o dicionário da Porto Editora aqui).

Já a Wikipédia define feminismo como um conjunto de movimentos políticossociaisideologias e filosofias que tem como objetivo comum: direitos iguais e uma vivência humana por meio do empoderamento feminino e da libertação de padrões opressores patriarcais, baseados em normas de género. Envolve diversos movimentos, teorias e filosofias que advogam pela igualdade entre homens e mulheres, além de promover os direitos das mulheres e seus interesses.(Poderá encontrar o texto na íntegra aqui).

O que penso sobre o ser feminista vai de encontro com as definições acima expostas. É basicamente a capacidade de respeitarem a mulher como um ser igual aos homens, com as mesmas capacidades de pensamento de acção, e para tal que a mulher não seja descriminada por ser mulher. Não estou aqui a falar da questão de força, porque sim, a partida, mas não como regra, a mulher é mais "frágil" fisicamente que o homem. 

Estou a falar na capacidade de pensar por si, de criar, de agir. Sim devemos ter os mesmos direitos e os mesmos deveres que os homens numa sociedade. Podemos ocupar lugares de destaque nas empresas, nos partidos políticos, nos estados governativos, enfim na sociedade. E não, isso não nos faz menos mulheres, pelo contrário, faz-nos ainda mais mulheres.

Mas.... e isto para mim é um grande MAS! Mas o facto de ser a favor do empoderamento feminino (usando o Wikipédia) não quero com isso dizer que concordo que só porque se é mulher devamos ocupar cargos de destaque, independente das competências e capacidades para assumirem estes cargos. 

Se concordo com as quotas mínimas impostas por certos governos como definir a % de mulheres estudantes nas universidades, dirigentes políticos ou % de gestoras que devam ocupar determinados lugares nas empresas?... Não, não concordo. Calma ... vou explicar.

Acho que as pessoas devam ocupar os cargos/lugares por competência e não por serem mulheres. Assim, sou a favor da igualdade das regras, que sejam dadas as mesmas condições a homens e mulheres para que disputem uma posição e ... que ganhe o melhor, independente do sexo. O melhor deverá ser aquele com mais capacidade, o que tem mais condições de exercer com brilhantismo a actividade. 

E não me venham com tretas de dizerem ... vamos nomear uma mulher porque fica bem. Mas o mesmo em relação aos homens, não me venham com tretas de "é melhor ser um homem a ocupar esta posição porque é algo muito exigente". Ocupa o melhor, e o melhor nada tem a ver com o sexo.

Isto tudo veio-me a cabeça por causa da eleição do novo Secretário Geral das Nações Unidas. Desta vez a ONU decidiu ter um processo de eleição mais claro e mais público, em que tivemos a possibilidade de acompanhar os debates, entrevistas e as votações. Mas mostrou também um lado de um feminismo "sujo", em que só porque ficava bem e para querer passar uma ideia de evolução, muitos defendiam a eleição de UMA secretária geral, logo se é uma deveria ser uma mulher, lógico (?)... fica para um outro post ahahhah...coisas do mundo moderno.

Confesso que desde o início quando soube que o António Guterres se candidatava fiquei feliz. Primeiro por ser português, confesso. Segundo por falar português, seria (agora uma certeza, será!) o primeiro Secretário Geral da ONU a ter o português como língua materna e em terceiro pelo bom trabalho que o mesmo fez enquanto Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados. Logo, o mesmo já tem bagagem do que é a ONU.

Então não entendi porquê que insistiam em querer uma Mulher para o cargo, só por ser uma MULHER! Mesmo que as mesmas tivessem menos competências demonstradas. E entristeceu-me ver uma Mulher que respeito, por ser um AS num mundo tão machista como a Angela Merkel apoiar Kristalina Georgieva só porque era uma mulher e tendo esta sido introduzida no meio do processo porque a aposta inicial em Irina Bukova mostrava-se um falhanço.

Como mulher defendo, e volto a dizer, as mulheres têm os mesmos direitos e deveres, capacidades e competências nas sociedades. Mas, não quer dizer que só porque são mulheres, e porque fica bem, deverão ocupar posições de destaque ou estratégicas, por isso...pelo simples facto de serem mulheres.

Quanto as sociedades, apesar do movimento feminista ter tido início na década de 60, ainda verificamos que há muito a fazer... a prova é o meu dia a dia, que convivo com mulheres, que já saíram de casa, que trabalham, estudaram mas que ainda mantêm um pensamento bastante "machista" e que condenam vivamente as mulheres feministas. Vamos educar as crianças - meninos e meninas - a serem feministas, porque ser feminista é lutar pela igualdade de direitos do ser humano, independente do género. E por arrasto, vamos abolir e pregar a igualdade da raça também ... porque não?

Termino deixando as palavras de uma grande feminista dos nossos tempos, Chimamanda Ngozi:

"We teach girls to shrink themselves
To make themselves smaller
We say to girls,
"You can have ambition
But not too much
You should aim to be successful
But not too successful
Otherwise you will threaten the man."
Because I am female
I am expected to aspire to marriage
I am expected to make my life choices
Always keeping in mind that
Marriage is the most important
Now marriage can be a source of
Joy and love and mutual support
But why do we teach girls to aspire to marriage
And we don't teach boys the same?
We raise girls to see each other as competitors
Not for jobs or for accomplishments
Which I think can be a good thing
But for the attention of men
We teach girls that they cannot be sexual beings
In the way that boys are
Feminist: the person who believes in the social
Political, and economic equality of the sexes"



Seja feminista, mas quanto baste!

terça-feira, 13 de setembro de 2016

O sorriso de uma criança - as minhas crianças

Nada me acalenta mais a alma que o sorriso de uma criança, sou uma apaixonada por crianças. 

Quando vejo uma criança, o meu primeiro instinto é sorrir-lhe, para que elas sorriam de volta... dou por mim, instintivamente, a colocar-me ao nível delas, nem que para isso tenha de sentar-me no chão e quiça deitar-me ... gosto da alegria delas, da paz, da curiosidade que sentem pelas coisas... resumindo gosto muito das crianças.

E como é natural, sou apaixonada pelos sobrinhos que tenho e pelos milhentos afilhados que uns pais malucos me deram hahahha. Mas porquê que escrevo sobre isso? Ok, gostas de crianças, e? 

Esta vontade de falar de crianças se deveu a uma foto que vi, e que acabou como foto do meu ecrã, da minha sobrinha #JJacaré (prefiro não escrever o nome dela, logo fica como é tratada em casa), em que a mesma está com um sorriso, que naturalmente me fez sorrir, me fez acreditar e até ter esperança. Esperança que ainda há esperança - sendo bastante redundante - esperança num mundo cada vez mais violento, mais sofrido.

E claro que isso me levou a pensar nas crianças do meu país e de outros países, em que as crianças são obrigadas a deixar de ser crianças demasiado cedo.

Todos os dias quer seja a caminho do trabalho ou a caminho de casa se não me abstrair da realidade, como muitas vezes acabo por fazer, o que vejo não há como não me deixar triste. Vejo crianças a deambularem pelas ruas, a pedir nos semáforos, outras sentadas no chão ou porque têm fome ou porque se cansaram de pedinchar por uns míseros tostões... Umas a vasculharem nos lixos a procura de comida. Confesso que também temos as que caminham com as suas batas brancas a caminho para a escola/casa. 

As que estão paradas nos somáforos, muitas são enviadas pelos familiares para ali ficarem, logo exploradas a vista de todas. Outras a sua casa é a rua, logo se calhar ali é o quarto delas. Resumindo é um cenário triste de se ver. Confesso que no início olhava para aquelas caras todos os dias e magoava-me o coração, sentia um aperto como não só. Mas quando a dor é uma realidade aprendemos a conviver com ela, e hj confesso que muitas vezes me abstraio no meu mundo e não "vejo". 

Tenho uma imagem guardada na minha mente a já um ano e cada vez que ela vem a minha mente não há como sorrir. É  a imagem de um menino agarrado ao seu irmão mais novo, a dormirem no chão  do passeio que separava as vias de uma avenida super movimentada. Se fosse num outro contexto, seria uma imagem bastante ternurenta com bastantes "likes" nas redes sociais, acredito. Mas naquele contexto, uma imagem bastante cortante. ... 

Uns dias mais tarde voltei a vê-los no mesmo sítio, desta acordados, sempre com o irmão mais velho - que provavelmente não teria mais de 7 anos a cuidar de um irmão que devia ter 1 ano e meio - a proteger o mais novo, agarrando-o para que ele nas suas brincadeiras, não fosse parar a estrada. Mas neste dia eles sorriam, estavam a ser crianças, apesar de na realidade lhes estava a ser roubada esta possibilidade. 

O que quero com estes dois exemplos mostrar é que uma criança será sempre uma criança, por mais adversa que a sua situação seja. Irá brincar, irá sorrir, irá ter curiosidade... Mas, a liberdade de realmente ser criança, de se sentir segura, de poder brincar sem fome, sem medo das guerras, do "bicho papão" só depende de nós, adultos, que temos a responsabilidade de cuidar, amar e garantir um mundo melhor para esses seres tão especiais que um dia serão o futuro das nossas sociedades.

Como educamos, como cuidados, como amamos uma criança hoje vai se reflectir no seu amanhã... logo hoje somos responsáveis por garantir um amanhã melhor. 

Assim como amo ver uma criança sorrir, odeio ver uma criança a sofrer ... nestas situações dava tudo para ser uma "supermulher" e garantir o seu bem estar ...o bem estar de todas as crianças do meu país, para que elas possam ser o que são: crianças!

Quando estiver com uma criança, seja criança. Se tiver uma (ou várias), ame-as, cuide-as, eduque-as para que sejam seres humanos bondosos e amáveis, preocupados com o próximo. Mas não cinja a sua atuação as que conhece. Apoie grupos de solidariedade, apadrinhe uma criança, garanta o futuro de uma... faça algo. Pode parecer pouco, mas lembre-se que estará a mudar o futuro de alguém.

Seja criança...!




quinta-feira, 30 de junho de 2016

Massangano - Resgate a história de Angola

A uns meses atrás o grupo das viagens de carro enviou-nos um e-mail provocativo a falar de uma viagem ao Kwanza-Norte*, mais propriamente no município de Cambambe e para ser mais especifico ainda, a Localidade de Massangano. Uma viagem curta, de carro, para bem pertinho de Luanda. Segundo eles não seria necessário mais do que um fim-de-semana.

Confesso que o facto de ser perto de Luanda e não ser necessário mais do que dois dias atraiu-me logo, por isso confirmei a minha presença. Depois li que seria uma viagem mais histórica, já que íamos atrás do que restavam de relíquias do nosso passado - aí nasceu o verdadeiro interesse, mas confesso que nada por aí além. Julgava eu que seria algo muito simples, até porque o nome Massangano não fazia soar nada na minha memória das aulas de história.

No dia programado saímos de Luanda rumo ao Dondo, com uma breve paragem por Catete para tomar o pequeno-almoço. Já pertinho do Dondo, aproximadamente a 25 Km, fizemos um desvio onde encontramos uma placa que dizia, Santuário de Nossa Senhora da Victoria de Massangano. Confesso que nunca havia ouvido falar deste Santuário e por esta razão ia ficando cada vez mais intrigada... Mas que "raio", dizia para mim, como poderia nunca ter ouvido falar?


Continuamos por uma estrada de terra batida, que em alguns pontos o capim quase que cobre a estrada, escondendo aquele ponto tão importante da nossa história. Passamos a caminho por vilas quase abandonadas, outras perdidas no tempo. A população via-nos passar e olhava para nós com o olhar inquisidor, pois éramos onze carros a "desbravar" uma trilha rumo a nenhures.



Depois de quase desbravarmos aquela estrada eis que nos surge a placa a dizer Massangano. Chegamos! Sem ter noção do que nos esperava, eis que nos surge do lado esquerdo as primeiras relíquias da nossa história, um poste de iluminação! e do nosso lado direito um monumento que nos deixou logo em transe - as ruínas do Tribunal e casa de reclusos. A pergunta que se formou na minha cabeça: "que lugar é este e porquê  tão esquecido?


 Poste de Iluminação

Tribunal e Casa de Reclusos

Para nos apresentar a história desta localidade e desvendar a história associada tivemos o prazer de conhecer o Catequista Miguel da Igreja de Nossa Senhora da Victória de Massangano. 

O mesmo começou por nos explicar a razão do nome da aldeia, explicando que quando Paulo Dias de Novais chegou a local, na sua viagem a procura das lendárias minas de prata, encontrou algumas mulheres a pisar o milho para fazer a fuba de milho, e questionou-as sobre o nome do local. As mesmas que não entendiam português julgaram que o mesmo estava a perguntar o que estavam a fazer, tendo por isso respondido na Língua Nacional Kimbundu “massa n’gana”, tendo por isso assumido ser este o nome da Aldeia. O nome original da aldeia era N’Guimbi ya Songo.

Findo algum tempo claro que foi desvendado que na realidade o nome do Aldeia não era Massangano mas sim N'Guimbi ya Songo. A questão que se coloca é, porque não se voltou a alterar? A pois é, como é bela a nossa história. Esta aldeia fazia parte do Reino do Ndongo, que era um Reino "rival" ao do Reino do Congo, e como o nome Songo se aproximava de Congo, optou-se por manter-se o nome Massangano, para não confundir os aliados.

Paulo Dias de Novais acabou por ficar interessado no local devido a sua localização, já que é nesta região que o Rio Kwanza e o Rio Lucala (Rio das Quedas de Kalandula) se encontram, logo era um ponto estratégico de ligação a Luanda e ao interior do País. Assim sendo, em 1583 foi contruído o Forte (ou Fortaleza) de Massangano e a cidade passou a ser a base dos Portugueses durante as explorações que os mesmos levavam a cabo para o interior do país, a procura das minas e para a captura dos escravos.

Fortaleza de Massangano





1ª Câmara Municipal de Massangano



Por esta razão, podemos encontrar nesta mesma região, um mercado de escravos, onde os escravos eram baptizados, dado nomes portugueses, expostos e comercializados, principalmente para o Brasil. Após a venda os mesmos eram metidos em barcos e desciam o Kwanza, rumo a Luanda para serem postos em navios negreiros para a America.





Paulo Dias de Novais tendo não só se apaixonado pelo local,, construiu a sua casa e reza e também encontrou o seu amor por uma local. Teve uns anos longe, pois teve de voltar a Portugal a busca de mais recursos, mas voltou para Massangano onde acabou por morrer  em 1589 e foi enterrado, junto a Igreja de Nossa Senhora da Victoria de Massangano.



Contudo, apesar da tumba continuar aí exposta o seu corpo foi transladado. A quem diga que para Portugal outros dizem que para Luanda, para a Igreja de Jesus, na Cidade Alta.

No Século XVII com a ocupação de Luanda pelos Holandeses, de 1641 a 1648, os portugueses foram forçados a subir o Rio Kwanza e Massangano foi durante este período a Capital de Angola.

Durante a presença portuguesa em Massangano foram construidos no Local, o tribunal e casa de reclusos, uma cadeia onde ficavam os presos condenados a prisão "perpétua" - esta era um edifício subterrâneo que devido aos anos e a falta de cuidado desapareceu, a Câmara Municipal, a Igreja de Nossa Senhora das Vitórias (que serviu como Catedral durante a ocupação de Luanda), a Fortaleza e o mercado de escravos, entre outros que já não há sinais.




Resumindo para não estar aqui a debitar toda a aula de história que recebemos, Massangano é um local repleto de história que se está a perder, mas que ainda vamos a tempo de resgatar. Mas queremos?

Após a visita a estes locais rumamos até a Margem do Lucala, onde o nosso barco nos aguardava para prosseguirmos com o nosso roteiro. A surpressa é que iamos navegar o Lucala até junto a uma ilha no meio do rio, onde nos seria servido o almoço. Foi uma viagem magnífica de aproximadamente 1 hora, rodeados por uma paisagem única por desbravar. Confesso que, foi a primeira vez que naveguei por um rio em Angola e posso dizer que valeu muito mais que todas as outras. Tivemos a oportunidade de ir vendo enquanto navegavamos o mercado, a fortaleza e a câmara municipal, já que estes edifícios estão todos voltados para o rio.

Postos na ilha encontramos uma casa antiga, ainda em muito bom estado mas abandonada. Com algumas aldeias a volta. Para as crianças destas aldeias, esta casa e seus anexos serviam como espaço de brincadeira. Após o almoço, voltamos para o barco e fomos brindados pelo mais belo Pôr-do-Sol que alguma vez vi. Já vi bastantes, sou apaixonada por eles, mas aquele foi de cortar a respiração.


Para a nossa surpresa, não voltamos para o mesmo ponto, paramos antes, mesmo por baixo da enconsta onde se situava a Câmara Municipal. E a aventura foi.... trilhar o caminho que a população faz para ir buscar água ao rio. Sim, rumamos enconsta acima, melhor escalamos enconsta acima guiados pelas crianças da aldeia que se divertiam connosco, com a nossa dificuldade de trepar e percorrer a encosta e o nosso medo. A diferença gritante entre nós e eles ... eles trepavam a encosta com baldes cheios de água que os mesmos foram buscar ao rio, numa rápidez inacreditável.

Uau um exemplo de força, de garra que nós que vivemos na cidade não temos e facilmente nos esquecemos que para lá da nossa realidade há uma outra bem mais dura.

Após subirmos a enconsta fomos caminhado com as crianças até aos carros. Saímos da Aldeia já de noite e foi aí que o tive a oportunidade de ver algo que a muito não tinha a oprtunidade de ver. Um Céu tão estrelado que as estrelas "lutavam" entre si a procura de um espaço para poderem brilhar. Um Céu tão preenchido, tão cheio de força, enfim tão mágico.... a última vez que vi um Céu assim em Angola foi no Lubango, mas já lá vão uns 10 anos... agora com a poluição, já não avistamos esta beleza.

Rumamos para o Dondo para finalmente repousar. No dia seguinte, a aventura era até ao Rápidos de Kabalo. Para lá chegar saímos do Dondo no desvio que para Kapanda e Pedras Negras de Pungo-N-Dongo (Pungo Andongo). Andamos cerca de 1 hora numa estrada de terra batida até que desviamos numa aldeia, seguimos por um trilho, com alguns troços em mal estado, com a vegetação a querer esconder o caminho e depois de muito andar foi aí que chegamos a uma ponte enorme, magestosa que tem anos e qe continua em óptimo estado - nem parece ser uma construção tão antiga e sem qualquer manutençao. E foi aí, enquanto percorriamos a ponte que se ouviu em unissóno, pelo menos no nosso carro, UAU!!!!!





O que viamos tanto de um lado como outro era maravilhoso. Esta terra é extremamente abençoada, com as mais belas paisagens naturais que se pode imaginar. Mas está tudo tão perdido, esquecido que ou se tem vontade de ir a aventura ou se perde tanta maravilha. Eu optei por ir a aventuda.

Ficamos por ali maravilhados a tirar fotos, descemos ou tentamos descer pela ponte para chegar mais perto do Rio. Tivemos de parar! Os locais avisaram-nos que por debaixo da ponte, nas Pedras , no Rio ainda haviam minas, e aí a realidade voltou, o país esteve em guerra ainda há vestígios da mesma. Cautelosamente voltamos, pisando nos mesmos sítios por onde haviamos passado.

Aproveitamos mais um pouco do local e de seguida voltamos a entrar para os carros, rumando para o Dondo para comermos a beira do Rio. Confesso que esta parte não é das minhas preferidas , mas entrando no espiríto lá fomos. Após o almoço a aventura era voltarmos para Luanda, e assim foi, até porque tinha de ser assim.

Foi uma boa viagem, pequenina mas repleta de história e beleza. Serviu para desvendar um pouco mais do enigma que é Angola. Recomendo, pois não se vão arrepender.


*Sou do tempo que Kwanza-Norte se escrevia com K e não com C como recentemente "inventaram". Assim como Kwanza-Sul, Kuando-Kubango, Kunene, logo recuso-me a escrever o nome destas províncias com C.

domingo, 12 de junho de 2016

Fui ao Uíge e GOSTEI! Sem esquecer Ndalatando

Sim fui ao Uíge! E estava ansiosa para vos contar. Foi simplesmente divinal.

Em Março deste ano tive o prazer de me meter na estrada com o grupo de amigos e rumar para o norte do País, para a famosa terra do bago vermelho, assim conhecida porque no passado foi um dos maiores produtores de cafés do mundo. Confesso que estava ansiosa e posso dizer que apesar de ter ido sem qualquer expectativa, saí de lá completamente apaixonada.

Saímos de Luanda e optamos por seguir pelo caminho mais rápido mas também mais perigoso, diga-se de passagem. Confesso que não o sabia, pois só depois de falar com a minha mais velha é que soube que o dito caminho tão belo, era odiado e metia medo até aos exímios motoristas. 

O objectivo era proporcionarmos um agradável passeio por este caminho conhecido pelas suas curvas e contracurvas que marcam a serra. Assim lá saímos por Caxito - que continua parada no tempo, com uma rua principal que por sinal é a única que está asfaltada e onde se situam as principais repartições do estado e as agências bancárias. Custa crer que falamos de uma capital de uma província. Seguimos de seguida pelo Úcua, passando pelo Piri, Mobil e por fim Quitexe antes de chegarmos a bela cidade do Uíge.

quinta-feira, 31 de março de 2016

Luanda e os seus contrastes

Ontem estava num concerto de Piano e Canto, a delirar com aquela beleza, beleza da arte de bem cantar e bem tocar, quando a minha mente começou a divagar, o que é normal enquanto oiço música clássica.

Divaguei não para muito longe, na realidade continuei por Luanda. Lembrei-me que a algumas semanas tinha ido jantar a um restaurante francês e neste dia o chef tinha vindo de França e brindou-nos com belos pratos em que aliou a culinária francesa aos sabores tão típicos de Angola. Uma fusão que resultou em algo magnifique.

Mas ao lembrar-me desta noite em que a comida sabia a França e embalada pelo som do piano e da voz maravilhosa da Mezzo Soprano, lembrei-me também da carência do meu povo, lembrei-me das crianças que morrem nos hospitais porque faltam os medicamentos, os materiais hospitalares e até falta enfermeiros e médicos.

Lembrei-me, e não podia não deixar de me lembrar, do lixo que se acumula em todas as esquinas e todos os cantos, das águas paradas, mesmo não estando a chover, lembrei-me que o glamour que estava a viver nesta noite me distanciava dos milhões de angolanos que viviam em condições precárias.

E com este pensamento cheguei-me a sentir culpada. Será que faço o suficiente para ajudar o meu povo? Será que o dinheiro que paguei pelo jantar e pelo conserto não poderia ter usado para ajudar alguém? Será que me estava a tornar insensível a realidade do meu país? Será? Será? E os serás foram se acumulando na minha mente, preenchendo a minha alma.

Mas nos serás também surgiam respostas incompletas que tentavam acalmar a minha alma, que tentavam me fazer acreditar que fazia a minha parte, que não me deveria sentir culpada por ter a oportunidade de usufruir daquele momento.

Sei que poderia/posso fazer mais do que faço para ajudar o meu povo,  sei que poderia/posso ser mais participativa e não vou andar por aqui a inventar desculpas para justificar o porquê de não o fazer. A mudança começa em nós e todos nós temos a possibilidade de ajudar na mudança, basta querer.

Como tive a oportunidade de escrever para um grupo de amigos, somos uma pequena gota de água, mas se todas estas gotas se unirem, poderemos não criar um oceano de solidariedade mas de certeza que conseguiremos criar uma lagoa. 

Luanda e os seus contrastes, como a beleza de uma noite nos atinge perante a fealdade do que vai acontecendo não só as noites, mas também durante o dia, em todos os bairros em todas as esquinas...

Nos bairros não se ouve o canto de uma mezzo soprana nem o som do piano, ouve-se o choro de uma mãe, de um pai impotentes perante a situação, desesperados perante o vazio da perda... privilegiados somos nós que ouvimos um canto diferente, mas o facto de sermos privilegiados não nos deve tornar surdos para a dor. Privilegiados somos nós que degustamos sabores viajados, mas não nos podemos tornar cegos perante a carência que se tornou inquilina destas casas. 

Luanda e os seus contrastes... é assim a cidade onde vivo. Se tenho orgulho? Não, não tenho. Tenho orgulho do país que Deus criou para nós, lindo. Mas não tenho orgulho de saber que 99% dos meus irmãos sofrem...Vou continuar a ser uma gota, isto recuso-me a deixar de ser... um dia posso vir a ser uma lagoa.


domingo, 20 de março de 2016

Dia do Pai

Nunca tive das melhores relações com o  meu pai. Na realidade ele foi um pai ausente. Tive é uma mãe que foi as duas coisas...

Mas apesar de o meu pai ter sido ausente recordo-me que sempre morri de amores por ele. Sempre senti uma admiração, um pouco doentia, sem explicação por ele ... lembro-me de ser criança e de olhar para ele como se olhasse para o paraíso.

No conturbado da nossa relação sempre pensei que ele não me amava, que era aquela filha que ele teve e que foi mais uma ... Nunca o entendi e confesso que só no dia 07.12.2013 entendi quem era o meu pai e porquê da sua personalidade. ...perdi-o no dia 08.12.2013.

Sim, compreendi melhor o meu pai um dia antes de o perder. E o amor e admiração que sempre senti por ele, mas que sempre combati, veio ao de cima neste dia, por isso na última vez que tive com ele, no dia que o perdi, dei-lhe amor, o amor que sempre senti por ele.

Hoje sei que o meu pai me amou ... afinal fui a sua Nucha e só depois de muitos anos é que dei-me conta que sempre tive um nome de mimo para ele. Só depois de muitos anos é que percebi que quando o meu pai me ligava para falar de seguros ou da qualidade do sinal do telemóvel era a maneira dele dizer-me que estava com saudades.

Se cá estivesses provavelmente não ligaria para ti.... mandaria uma sms porque estaria zangada contigo.... mas hoje daria tudo para poder ter-te aqui comigo.

Não tínhamos uma boa relação mas eu sabia que estavas por cá. ..a distância de um telefonema  ou mesmo de 30 minutos de carro. Hoje já cá não estás. ...continuo a amar-te, a admirar-te, como sempre o fiz em segredo, mas hoje a desejar que não tivesses partido, que continuasses aqui.

Sinto saudades do que não vivemos, sinto saudades de ser a filha que desejei ser depois de te conpreender.

Um dia te amei, hoje te amo e te amarei para sempre meu pai e hoje como todos os dias sinto a tua falta.

Feliz dia do pai Luidgi, meu Luidgi. ..amo-te muito meu, muito meu Pai.